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quarta-feira, 16 de maio de 2012

As emoções por meio das culturas



As expressões de emoção são as mesmas pra pessoas de qualquer lugar no mundo? Quando alguém está com raiva, veremos a mesma expressão em sua face não importando sua raça, cultura, ou língua? Ou as expressões faciais são uma língua, na qual precisamos aprender o significado para cada diferente cultura, assim como precisamos aprender um idioma? 

Um pouco mais de cem anos atrás, Charles Darwin escreveu que expressões faciais são universais, não aprendidas diferentemente em cada cultura, que elas são determinadas biologicamente, produto da evolução humana. Desde Darwin muitos cientistas tem discordado enfaticamente. Recentemente, entretanto, pesquisadores solucionaram essa questão, mostrando que a aparência de pelo menos sete emoções são universais, embora aja diferenças culturais sobre quando essas expressões devem ser mostradas.


Pesquisas conduzidas por Ekman tiveram um papel central para resolver a disputa se as emoções eram universais ou aprendidas culturalmente. Em seu primeiro estudo, ele mostrou algumas fotografias para pessoas de cinco países — Chile, Argentina, Brasil, Japão e Estados Unidos — e pediu para que julgassem a emoção exposta em cada expressão facial. A maioria das pessoas chegou a uma mesma conclusão, o que indicou que as expressões podem realmente ser universais. Carrol Izard, outro psicólogo, estava trabalhando em outras culturas, fez quase a mesma experiência e obteve os mesmos resultados.

Exemplos de fotografias usadas no estudo, com porcentagem de concordância em como as fotografias foram julgadas nas diferentes culturas:

Estados Unidos
Brasil
Chile
Argentina
Japão
Medo
85%
67%
68%
54%
66%
Aversão
92%
97%
92%
92%
90%
Alegria
97%
95%
95%
98%
100%
Raiva
67%
94%
90%
90%
90%

Havia um problema: como assumir que pessoas de diversas culturas chegaram à mesma conclusão a respeito de uma emoção quando tantas outras pessoas constataram exatamente o oposto? Não foram somente os viajantes que sustentaram que as expressões dos japoneses, chineses ou de outros grupos culturais tinham significados bem diferentes. Birdwhistell, respeitado antropólogo especializado no estudo das expressões e gestos, escreveu que abandonou as ideias de Darwin quando constatou que, em diversas culturas, as  pessoas sorriam quando estavam tristes. A afirmação de Birdwhistell combinava com a visão dominante na antropologia cultural e em grande parte da psicologia: algo socialmente importante, tal como a expressão emocional, deve ser fruto do aprendizado e, dessa maneira,  diferente em cada cultura.

Ekman propôs, que o controle da forma de exibição das emoções são socialmente aprendidas, muitas vezes culturalmente diferentes, de quem pode demonstrar que emoção para quem e de quando pode fazer isso. Essas regras podem ditar a diminuição, o exagero, a dissimulação ou o fingimento da expressão do que sentimos.

Ele diz: "Testei essa formulação em uma série de estudos que mostram que, quando sozinhos, japoneses e norte‑americanos exibem as mesmas expressões faciais ao assistir a filmes de cirurgias ou acidentes, mas quando um cientista estava perto, os japoneses, mais que os norte‑americanos, mascaravam as expressões negativas com um sorriso. Em particular, expressões inatas; em público, expressões controladas. Como o comportamento público é o mais observado pela maioria dos antropólogos e viajantes, tive minha explicação e evidência de seu funcionamento. Em comparação, os gestos simbólicos — tais como a cabeça que faz que sim com um movimento, a que faz que não com um balanço e o gesto de positivo com o polegar — são realmente específicos à cultura. Nesse caso, Birdwhistell, Mead e a maior parte dos outros cientistas comportamentais tinham razão, ainda que estivessem errados a respeito das expressões faciais das emoções.".


Havia uma brecha na pesquisa de Ekman. Todas as pessoas que ele e Izard havíam estudado podiam ter aprendido o significado das expressões faciais ocidentais assistindo a Charlie Chaplin e John Wayne numa tela de cinema ou tevê. O contato com a mídia ou com outras culturas pode explicar por que pessoas de culturas diferentes chegaram a uma mesma conclusão a respeito das emoções das fotografias que eles mostravam. Ele precisaria de uma cultura visualmente isolada, onde as pessoas nunca tivessem visto um filme, um programa de tevê ou uma revista e que possuíssem pouco conhecimento de estrangeiros.
"Se chegassem às mesmas conclusões das pessoas do Chile, da Argentina, do Brasil, do Japão e dos Estados Unidos, eu teria acertado em cheio", disse Ekman.
Iniciou, então, uma pesquisa nas regiões montanhosas de Papua‑Nova Guiné, onde vivia uma população isolada. Ele leu para as pessoas uma história e lhes mostrou um conjunto de retratos. Tudo o que eles tinham de fazer era escolher aquele que combinava com a história. Eram muito simples: “Os amigos chegaram e ele está feliz; ele está furioso e prestes a lutar; o filho morreu e ela está muito triste; ele está olhando para algo que não gosta; ela está olhando para algo que cheira mal; ele agora está olhando para algo novo e inesperado”.



Em poucas semanas, entrevistaram mais de trezentas pessoas, cerca de 3% de indivíduos pertencentes a essa cultura, um número mais que suficiente para uma análise estatística. Os resultados foram muito bem definidos para felicidade, raiva, aversão e tristeza. Medo e surpresa não se distinguiram um do outro. Quando as pessoas escutavam a história a respeito do medo, escolhiam muitas vezes a surpresa como uma expressão de medo, e vice‑versa. Mas esses sentimentos eram diferenciados com relação à raiva, aversão, tristeza e felicidade. Até hoje, ainda não se sabe por que medo e surpresa não eram diferenciados entre si. Pode ter sido um problema com as histórias, ou talvez essas duas emoções se misturem tão frequentemente na vida dessas pessoas que não são diferenciadas. Nas culturas letradas, medo e surpresa são diferenciados um do outro.

Outro tipo muito diferente de evidência também respalda a afirmação de Darwin de que as expressões faciais são universais, produtos de nossa evolução. Se as expressões não precisam ser aprendidas, aqueles que nasceram cegos devem manifestar expressões similares às daqueles indivíduos dotados de visão. Diversos estudos foram realizados nos últimos sessenta anos, e isso foi constatado repetidamente, em particular para expressões faciais espontâneas.

Essas descobertas interculturais impulsionaram investigações referentes a diversas outras perguntas a respeito de expressões faciais: quantas expressões as pessoas podem fazer? As expressões fornecem informações precisas ou enganosas? Todo movimento facial é sinal de uma emoção? As pessoas podem mentir com suas fisionomias do mesmo jeito que com as palavras? Havia muita coisa a fazer, muita coisa a descobrir. Atualmente, há respostas para todas essas perguntas, e outras mais.


Fontes: EKMAN, Paul. A Linguagem das Emoções. Editora Lua De Papel, 2011
EKMAN, Paul, Friesen, W. V. Unmasking The Face. MALOR BOOKS, Cambridge, MA 02238





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